
A ausência de tratamento de esgoto regular em determinadas regiões do Brasil afeta negativamente a saúde e a qualidade de vida da população, aumentando os riscos de doenças e causando sérios danos ao meio ambiente. Reconhecendo a urgência de abordar este desafio, a Universidade Federal Fluminense (UFF), lançou um estudo para qualificar o tratamento de esgoto em estações pelo país.
Segundo o reitor da UFF, professor Antonio Claudio da Nóbrega, este projeto é um reflexo do comprometimento da Universidade com a inovação e a sustentabilidade. “Através de parcerias estratégicas e do trabalho incansável de nossos pesquisadores, estamos não apenas abordando problemas críticos de saúde pública, mas também promovendo a sustentabilidade ambiental. Este esforço conjunto exemplifica nosso papel ativo na promoção de soluções que beneficiam tanto a comunidade científica, quanto a sociedade em geral”.
Este estudo é resultado da parceria entre a UFF, por meio do Laboratório de Empreendimentos Inovadores (LEI/UFF), a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e a AEGEA Saneamento e conta com apoio da Fundação Euclides da Cunha (FEC). O foco está no desenvolvimento de Modelos de Negócio para aplicação da tecnologia de Pirólise Lenta a Tambor Rotativo (PLTR) em Estações de Tratamento de Esgoto.
A tecnologia PLTR, escolhida pelo projeto, utiliza calor para decompor matéria orgânica sem liberar poluentes perigosos, tornando-se uma solução ideal para resíduos de diversas origens, que atualmente possuem elevado impacto ambiental. Para testar e demonstrar a viabilidade dessa tecnologia, a UFF implementou uma Unidade de Tratamento de Resíduos (UTR) piloto na estação de esgoto sanitário (ETE) de Arraial do Cabo para tratamento do Lodo Sanitário. De acordo com o coordenador do Projeto, professor do Instituto de Ciência e Tecnologia de Rio das Ostras, Rodolfo Cardoso, este equipamento não só trata o lodo, mas também está sendo utilizado para processar outros tipos de biomassas no futuro, incluindo resíduos urbanos e industriais.
“O Tratamento de Esgoto é de fundamental importância para a saúde da sociedade. Não se trata apenas de limpar efluentes nas ETEs, mas também de garantir a correta disposição final dos rejeitos, especialmente o lodo sanitário. Atualmente, os volumes de esgoto tratado no Brasil superam os 14,3 milhões de metros cúbicos por dia. Considerando que cada metro cúbico de esgoto pode gerar 0,25 kg de lodo, estima-se que mais de 3.500 toneladas de lodo sanitário são produzidas diariamente,” detalha o coordenador.
O pesquisador acrescenta que há uma previsão de aumento nestes valores, uma vez que mais de 30% da demanda de saneamento no RJ não é atendida e mais de 40% do esgoto coletado não é tratado adequadamente. Segundo ele, este projeto tem o potencial de reduzir significativamente o impacto ambiental da disposição do lodo em aterros.
Um dos maiores obstáculos enfrentados no processamento do esgoto é a disposição final do lodo, que além de apresentar riscos de contaminação e lixiviação, também é economicamente desafiador devido aos custos elevados de tratamentos prévios. Em sua maioria, esses resíduos são destinados a aterros sanitários, onde aumentam a complexidade da operação e impactam a capacidade dos mesmos, contribuindo para maior produção de percolado no lago de chorume. Esses custos podem representar mais de 60% do valor total do tratamento de esgoto, além de problemas com o licenciamento da autorização de disposição em muitos aterros existentes.
“A movimentação do lodo também envolve riscos ambientais elevados, especialmente durante o transporte, onde há cenários de possíveis vazamentos ou acidentes rodoviários devido à alta umidade do material. Esses fatores adicionam custos significativos às operações das Estações de Tratamento de Esgoto, incluindo a separação, armazenagem e movimentação interna, além dos custos de transporte,” adiciona o coordenador.
A implementação da pirólise como método para o tratamento de resíduos traz benefícios significativos tanto ambientais quanto econômicos, diminuindo impactos e gerando vantagens para a comunidade científica e a sociedade. Além disso, cria novas oportunidades de emprego em todas as etapas, desde a construção até a operação e manutenção de instalações de pirólise, bem como no comércio de seus subprodutos.
“O processo também abre caminho para a execução de diversos programas sociais, como a aplicação do biochar e da energia elétrica ou térmica, proveniente dos gases gerados, para comunidades carentes, promovendo assim a inclusão social e o desenvolvimento comunitário”, acrescenta o coordenador
Atualmente, o projeto está na fase de testes operacionais, onde se realiza a medição do balanço energético e a conversão do lodo em energia térmica e elétrica. Simultaneamente, está sendo realizada uma avaliação de impacto socioambiental, destacando-se o uso das cinzas transformadas em biochar, um material que pode melhorar a qualidade do solo.
Além do coordenador, a iniciativa também é composto por diversos pesquisadores, docentes e dicentes, do Laboratório de Empreendimentos Inovadores (LEI/ UFF), do Laboratório de Reatores, Cinética e Catálise (RECAT/UFF), do Instituto Federal Fluminense (IFF), além da Universidade Estadual do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).